Entre as penas humanas, a mais dolorosa é a de prever muitas coisas e não poder fazer nada. Heródoto
A história
representa o estudo das ações do homem no tempo, que transformam a natureza
originária, produzindo, assim, o mundo humano. Trata-se de uma disciplina que
busca apreender através dos registros memoriais, as causas, as relações e os
significados das vivências passadas, no intuito de compreender o presente, e
assim, por meio da consciência, modificar o futuro. Para Diehl (2006), citado
por Suassuna (2008), a história além de ser um bem cultural inestimável, com
valores implícitos e explícitos, representa uma comunicação entre esses três
tempos, tendo os sentidos como fio condutor. É por meio dessa comunicação que
se é possível compreender os eventos passados, avalia-los, transformando-os em
valores que serão integrados ao presente, alterando o futuro e sua ordem
natural.
Nesse sentido, tal como
coloca Suassuna (2008), estudar história significa compreender fatos e
experiências inseridos em um fluxo temporal, no qual passado, presente e futuro
estão interconectados. É justamente essa capacidade de interconectar os três
tempos de maneira consciente que diferencia a espécie humana dos demais
animais. Essa capacidade proporciona aos humanos a possibilidade de superar sua
condição orgânica biológica, chegando assim as “situações-limites” e aos “atos
limites”, que segundo Freire (2013) não se encontram nos animais. Sobre isso,
escreveu o autor:
Não
sendo o animal um “ser para si”, lhe falta o poder de exercer “atos limites”
que implicam uma postura decisória frente ao mundo, do qual o ser se “separa”,
e, objetivando-o, o transforma com sua ação. Preso organicamente a seu suporte, não se distingue dele. [...] A
diferença entre os dois, entre o animal, de cuja atividade, porque não
constitui “atos-limites” não resulta uma produção mais além de si, e os homens
que, através de sua ação sobre o mundo, criam o domínio da cultura e da
história, está em que somente estes são seres da práxis (FREIRE, 2013, p.
126-127).
A
partir desta afirmação, pode se dizer que a história, juntamente com a
consciência, a condição que a produz, faz do homem um “ser para si”, visto que
ela é uma das principais características que o diferencia dos outros animais e
demais seres vivos. O homem possui a capacidade consciente de registrar suas
memórias e de transmiti-la através da cultura. O homem da idade antiga será
diferente, em termos históricos, do homem da idade média, e este ao dá idade
moderna, o que possivelmente não acontecerá com os animais de ambas as épocas.
Sendo um ser histórico, o homem aprende e conserva seu aprendizado por meio das
memórias, transformando-o no decorrer das épocas.
O
estudo da história proporciona ao homem uma postura diferenciada em relação ao
passado, já que este estudo não se faz somente reproduzindo o mesmo de maneira
puramente descritiva, mas se faz de maneira ativa, crítica e avaliativa, pois a
história é construída por sujeitos que são, ao mesmo tempo, os autores e os
produtos de um continuo processo histórico. Assim como coloca Wertheimer (1989,
p. 5), a história trata de acontecimentos cujo respeito não se pode estar
seguro e cuja seleção para consideração é assunto idiossincrático e subjetivo,
nunca sendo imparcial. Sendo desenvolvida a partir da experiência subjetiva,
ela sempre terá traços das vivências de quem a criou, por mais objetiva que
pretenda ser. Nesse sentido, pode-se afirmar que:
(...)
a história não é independente do historiador. Ela não é algo preestabelecido. A
que evento dar ênfase, qual deles incluir ou excluir, como interpretar o que
foi escolhido – tudo isso depende do ponto de vista do historiador (WERTHEIMER,
1989, p.5).
A
partir dessa consideração, pode dizer que o historiador através, da seleção e
da ênfase dos fatos estudados assim como a forma que este percebe os mesmos,
remonta um significado particular, integrando assim o seu conjunto de valores
que são subjetivos. Ampliando esta reflexão, pode-se dizer que a história
(conhecimento histórico) é produzida pela interação entre a subjetividade do
historiador e a objetividade factual, ou seja, os acontecimentos históricos.
Não há fatos sem sujeito, da mesma forma que não existem sujeitos sem história.
Em uma compreensão ontológica, pode-se afirmar que os fatos existem em função
dos sujeitos, à medida que estes lhe agregam valor. Um fato que acontece fora da
percepção humana, não possuirá valor, e tampouco existência. Nesse sentido, a
história representa um agregado de valores que buscam configurar sobre como um homem ou uma sociedade viveu e existiu.
Estudar
história significa compreender a essência da humanidade que se faz em um continuo
processo de historização, que não se esgota, pois o ser humano sempre estará
produzindo passado à medida que existe no-mundo-com-os-outros. E decifrar esse
passado sempre será uma tarefa do homem do presente que buscará atualizar sua
historicidade através desta atividade, criando assim condições para atitudes que, superem o passado, e possam criar um presente autêntico.
REFERÊNCIAS
FREIRE,
Paulo. Pedagogia do oprimido. 54 ed.
rev. e atual – Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2013.
SUASSUNA,
Danilo e HOLANDA, Adriano. História da
Gestalt-terapia no Brasil: um estudo historiográfico. Curitiba: Juruá,
2008.
WERTHEIMER,
MICHAEL. Pequena história da psicologia.
Tradução Lólito Lourenço de Oliveira. – 8 ed. – São Paulo : Editora Nacional,
iniciação científica; v. 34, 1989.
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