quarta-feira, 8 de maio de 2013

A Concepção estética na filosofia de Shopenhauer (por Alvinan Magno)

           Certa vez um filósofo conceituou “arte” como a manifestação puramente intuitiva, cuja peculiaridade é elevar o homem acima dos interesses da vontade, o libertando da sofrida busca carnal e aliviando, no momento da criação e da contemplação, o sofrimento existencial. Segundo ele, ela é a forma mais verdadeira de compreensão e expressão do conhecimento humano. Por meio dela se é possível entrar em contato com a essência objetiva do mundo, transcendendo toda e qualquer determinação inconsciente correspondente a vontade. Sua conceituação colocou a  arte em uma instancia independente, tratada como a mais importante fonte de acessibilidade a realidade mundana. Este filósofo foi Arthur Shopenhauer, e sua compreensão filosófica trouxe uma inestimável contribuição para estética, área da filosofia que investiga os vários aspectos da manifestação artística. 
            Se por um lado ele afirma que estamos condenados a ser um veículo perpetuador da espécie,  fadados a determinações biológicas cujo único objetivo é a produção de um terceiro, por outro afirma que temos a possibilidade de proclamar nossa liberdade existencial, esta que só é possível através da manifestação artística. Neste sentido, a arte é compreendida como a busca platônica pela “ideia”, sempre associada ao conceito de belo e sublime. Porém esta “ideia” não é uma simples representação ideal de mundo, é o próprio mundo em sua mais bela e objetiva forma.  A apreensão da ideia, concebida por uma intuição evidente, torna a realidade humana menos dolorida e dá cor, tônus e beleza para o ser, revelando a verdade ontológica.        
            Nesta perspectiva, o belo, tido como a unidade fundamental da supressão da vontade, e da elevação da mente sobre o corpo, se torna o objetivo de toda e qualquer atividade artística, e o sublime o meio para alcançar essa condição existencial que consiste metaforicamente num voo transcendental sobre o mundo, as coisas e os outros.   Shopenhauer diz que para alcançar o belo em sua plena legitimidade, é necessário abrir mão de toda ligação com a vontade corpórea. É preciso abrir mão de toda racionalidade, pois, segundo o filósofo, até mesmo esta possui uma enraizada ligação com a vontade, que busca a conservação e manutenção da vida em seus preceitos e conceitos. Ser racional é descobrir o funcionamento da causalidade e com isso potencializar o instinto, a vontade de vida. Se a racionalidade está a serviço da vontade, e se esta vontade é tida como cega, inconsciente e irracional, pode-se deduzir que o racional é irracional, e neste sentido não pode trazer a verdadeira libertação existencial.
            Em busca dessa libertação, Shopenhauer, em seu livro metafísica do belo, faz uma criteriosa avaliação do belo nas diferentes manifestações artísticas. Ele descreve o por que de certas obras de artes mexerem tanto com o espírito humano, sobrevivendo por séculos! Para o filósofo, as obras que atingem a essência da humanidade, configuram um grau máximo de intuição se tornando eternas e inquestionáveis. Ao analisar o que se mostra essencial nas diversas modalidades de arte, ele considera as particularidades e diferenças entre elas; porém a essência geral de seu tratado persiste no fato de que para alcançar o belo é preciso vencer as forças inconscientes correspondentes a natureza instintiva, e sublimá-las ao mais elevado nível. Para isso somente a intuição, a compreensão espontânea das representações mundanas, pode ser útil neste processo, já que todo conhecimento racional se faz servo da vontade. Esta maneira de conhecer, alcança o conhecimento puro (a priori), e com ele a autêntica ideia de homem em perfeita comunhão com o mundo, sendo o “todo” e não uma parte escrava de seu mecanismo controlador: A vontade.  
            O naturalismo de Schopenhauer é considerado por muitos como pessimista. O motivo está na descrição filosófica de uma realidade cruel e demasiadamente dolorosa, porém inerente a natureza humana. Uma realidade que se encontra sobre o domínio da vontade que promove um impulso orgânico no sujeito, alimentando uma busca insaciável, raiz de todas as dores. Para Schopenhauer, esta busca irracional sustenta o niilismo, pois promete uma realização que nunca chega: Um desejo quando alcançado é substituído por outro, e assim perpetuamente; um organismo quando já não mais desempenha sua função natural é contemplado com a morte, tida pelo filósofo como um alívio das dores do mundo; independente, a vida continua em seu eterno ciclo. Porém não é somente a morte física que promove ao sujeito o alívio destas dores mundanas. Schopenhauer acredita que a arte, em sua manifestação estética, pode promover este alívio em um sublime arrebatamento, sendo a própria morte em vida!        
            A concepção estética na filosofia shopenhaueriana é um convite a uma avaliação extrema da realidade. Um convite a uma filosofia corpóreo-transcendental, que diferente da filosofia kantiana, alcança e compreende a coisa em si; Em Schopenhauer, vemos uma preocupação em definir filosoficamente o funcionamento concreto da natureza, porém sua ontologia não se rende a si mesma, questionando as diversas evidências desta em relação a existência humana. Do questionamento, surge uma magnânima sistematização e uma reposta positiva da qual podemos intitular de: A Sublimação da vontade como via de libertação e superação dos anseios existenciais. Esta sublimação por via transcendental, trás as condições para uma concepção estético-ontológica que tem como objetivo descrever as mais elevadas representações do ser; ao mesmo tempo em que produz um sentido existencial, responsável pelo preenchimento das lacunas formadas pela explanação do conceito de vontade.                    

Referências bibliográficas:

SHOPENHAUER, Arthur. Metafisica do belo. Ed. Unesco.

SHOPENHAUER, Arthur. O mundo como vontade e representação. Ed. Contraponto.

2 comentários:

  1. Quanta sabedoria do nosso querido Shopenhauer.
    Meus parabéns pelo trabalho.

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  2. Muito obrigado! Sempre estou postando; quando postar mando pra você. abraço...

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